Vovó Leonor e vovô Jones
Primeira lembrança dessa dupla maravilhosa vem de uma casa simples e antiga na Av. Braz de Aguiar, repleta de gente e administrada pela vovó Leonor que fazia milagres para render a comida e os pães.
Nós éramos acarinhados por esta alma iluminada que cercada de problemas não os deixava transparecer para nós, os pequenos.
Isto era o comportamento da época na nossa imensa família, a união e a ajuda entre os núcleos familiares se sobrepunha a qualquer intempérie.
Várias vezes fomos acolhidos, de mala e cuia, na casa de Tio Tonico, para passar as más fases e estas atitudes criaram em nós o respeito pelos mais velhos, o amor incondicional a todos eles e a sensação latente de amparo constante e imediato para toda nossa vida; acho que até hoje seus espíritos, incansáveis, ainda velam por todos nós e, com certeza estarão nos esperando quando atravessarmos a porta da vida e da morte, por nosso turno.
Contavam que algumas empregadas da casa dos pais da vó Leonor, ao passarem por ela a reverenciavam dizendo que era a personificação de um dos espíritos benfazejos que velavam por todos.
O pensamento flui com tanta intensidade que meus dedos não acompanham para escrever e, se o fizesse, para cada um dos membros da família haveriam capítulos e mais capítulos.
Vovó Leonor para nós, tia Leo para os sobrinhos, sempre estava pronta para nos receber, abraçar e cuidar, se lágrimas derramou, nunca foi em nossa frente, na doença e no sofrimento do vô Jones, se em algum momento se debilitou, o fez na presença de seus anjos e santos, nunca na nossa.
Por isto a sensação de controle e harmonia que nos passava.
O vô nos deixou bem antes e ela começou uma maratona anual de dar inveja, tinha um filho em Curitiba, um em São Paulo, uma no Rio de Janeiro e nós em Belém, resultado 3 meses com cada um e sempre se adaptando às rotinas de cada casa, basta dizer que meu pai tem o hábito de almoçar antes das 11:00 hs.
Quando fez 90 anos o Tito e a Ritinha organizaram uma festa maravilhosa que reuniu toda a família em São Paulo, teve missa, neto engasgando e chorando ao homenagea-la, (eu, o mais velho, fui o que mais chorou), às 4:00 hs da manhã ela se despediu dizendo que ia dormir e qual não foi nossa surpresa quando uns 30 ou 40 minutos depois voltou, banho tomada, alegre, sem um pingo de cansaço, dizendo que queria continuar na farra conosco e, só pelas 6 ou 7 horas da manhã, quando um dos tios foi ao segundo andar descobriu, que todas as crianças estavam espalhadas pelas camas, inclusive a dela e, para não incomodar ninguém, espantou o sono com um banho e voltou à cantoria, haja preparo físico.
Dizem que a pior dor é perder um filho e a vó ainda passou por esta já ao 97 anos, o tio Paulo foi se encontrar com o vô Jones.
No enterro ela permaneceu ao lado da Tia Celina e dos netos até a hora do sepultamento, abraçava um, beijava outro, acalentava um terceiro, dava a mão para tia Celina servindo de suporte para todo o grupo que lamentava a perda. Quando terminou pediu para voltar ao Rio de Janeiro e, alguns meses depois precisou ser hospitalizada para exames, e daí não se recuperou mais, partiu tranqüila, com a certeza da missão cumprida foi abraçar pessoalmente seu anjo da guarda, seus santos e os que a precederam.
Sinto saudades da vovó Leonor.